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Análise: a CBF vai errar se mantiver Dunga; e se demiti-lo, vai errar também

Presidente da CBF não tem elementos para tomar decisão, baseada na necessidade de paz e resultados, e não de um projeto para o futebol brasileiro, como deveria ser

Tudo indica que nesta terça-feira será decidido o futuro de Dunga e sua comissão técnica no comando da seleção brasileira. Seja qual for o final dessa história, a CBF vai errar. A opção por mantê-lo será equivocada. A escolha de substitui-lo também. Os donos da caneta não têm elementos nem capacidade para acertar. O que começou torto não pode terminar bem.

Apurações, impressões e conversas apontam para mudanças. A pressão, que já era intensa sobre Dunga, aumentou após a eliminação na primeira fase da Copa América. Mais uma gota d’água num copo de incompetência que transbordou há tempos.

Marco Polo Del Nero dará o veredicto. Há mais de um ano, por suas razões, ele não está com a seleção brasileira. Ele não viu, na condição de presidente da CBF, uma preleção de Dunga aos jogadores. Nunca olhou na cara de um atleta depois de um jogo para medir a temperatura de seu apreço pelo técnico. Jamais presenciou uma sequência de treinamentos que lhe permitisse avaliar o trabalho de campo da comissão técnica.

O dirigente não pôde captar qual era o tamanho da indignação deste grupo a uma derrota ou de sua vibração por uma vitória. Como pode definir se Dunga tem ou não que continuar à frente da seleção brasileira?

A decisão será tomada por razões menos nobres. Em meio à turbulência política e estrutural, resultados ruins fortalecem movimentos contrários. O ideal é ter tranquilidade, ser esquecido, passar despercebido, como se a ausência física não bastasse – o coronel Antônio Carlos Nunes, que cumprimenta pessoas com a mão na testa em sinal de continência, era o único dirigente da CBF nos Estados Unidos no momento da eliminação diante do Peru.

Os cartolas precisam de vitórias, não para que o Brasil volte a ser referência em futebol bem jogado, métodos, tática ou desenvolvimento de jogo, mas apenas para que tenham paz e sejam esquecidos por manchetes, CPIs e investigações.

Renato Augusto sofre com eliminação diante do Peru na Copa América Centenário, nos EUA (Foto: AP)

Com ou sem Dunga, o futebol brasileiro precisa de ideias. De um projeto bem elaborado e convicto do que se quer no futuro. Um projeto mais amplo do que ser campeão do próximo torneio. Do que agradar torcedores e mídia com uma atuação de lampejos individuais. Os pentacampeões – únicos – necessitam urgentemente saber o que querem da vida.

Não falamos aqui apenas de jogadores, dirigentes ou comissões técnicas, mas também de jornalistas, torcedores, cidadãos. Estamos todos errados com a Seleção, esse repentino alvo de piadinhas maldosas com quem todos fingem não se importar, mas adoram tacar pedras nos momentos mais doloridos como a derrota para os peruanos.

Babamos pelo futebol europeu, mas ficamos possessos quando um técnico muda o time de uma 

rodada para outra ou cria novo posicionamento para determinado jogador, baseado em treinos e observações. Enaltecemos o trabalho coletivo dos gringos, mas descemos a lenha se os nossos trocam um “meia” por um “volante”, como Dunga deveria ter feito com Walace no lugar de Lucas Lima, no segundo tempo frente ao Peru, e seria achincalhado por isso.

Nós nos derretemos por jogadores como Toni Kroos, Modric, Schweinsteiger, Pirlo, Pogba, Vidal, Iniesta, mas ainda insistimos em nomenclaturas retrógradas como “volantes” e “meias”, que só marcam ou só atacam. Quase tão antigo quanto os tiranossauros Rex.

Batemos na tecla de que se troca técnicos a todo instante, mas acordamos julgando absurda a permanência de Dunga depois de uma eliminação.

Em 2014, depois do 7x1 – ou 10x1, como bem diz Galvão Bueno –, a CBF apresentou Dunga. Um erro. Tite estava desempregado e era o melhor do país em sua função. Ainda é, e, se contratado, será a melhor escolha. Isso não quer dizer que o trabalho de Dunga tenha sido desastroso. Não é porque não concordamos com sua escolha que temos compromisso de criticá-lo.

Dunga, com todos os defeitos e virtudes bem conhecidos, trabalha numa confederação sem qualquer respaldo, desprestigiada no comando do futebol mundial, e quem o contratou hoje está preso pelas autoridades norte-americanas. Não é fácil 

Seu pior momento foram os 19 minutos finais da Copa América – talvez os seus 19 minutos finais no cargo –, quando precisava de um gol para se classificar e não mexeu na equipe, mesmo tendo duas substituições a fazer com boas opções no banco e desastrosas atuações de titulares. Talvez tenha sido seu ato mais indefensável nos seis anos acumulados como técnico da Seleção. Dunga tem dificuldade na gestão de pessoas e na aplicação das boas ideias que ele e seu auxiliar carregam, como a movimentação ofensiva e o meio mais criativo.

Os motivos pelos quais Dunga foi contratado em 2014 não convencem. As razões da CBF para pensar em demiti-lo agora, certamente, também são rasas. Temo que os argumentos por quem sugere Tite, melhor técnico do país, também sejam vazios. Que seja um acerto “sem querer”, baseado em resultados e em sua popularidade.

A Seleção do presidente ausente, do técnico inerte e do capitão que se diverte, toma champanhe, ganha beijinhos e gargalha como se não houvesse amanhã no dia em que a equipe sofre mais um baque histórico, não dá bons exemplos. Dentro e fora de campo.

Dunga é mais vítima do que culpado. Trocá-lo por Tite certamente vai melhorar a Seleção, mas não vai melhorar o futebol brasileiro, vítimas de mazelas muito maiores e mais profundas do que a carranca do capitão do tetra.

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