Um dos personagens principais da reintegração de posse da fazenda Buriti, em 2013, quando o terena Oziel Gabriel, 35 anos, foi morto a tiros, o delegado da Polícia Federal Alcídio de Sousa Araújo foi condenado a seis meses de prisão por violência doméstica. A decisão é da juíza de direito da 1ª Vara da violência doméstica e familiar contra a mulher da comarca de Campo Grande, Simone Nakamatsu, de 2015, mas que veio a público neste ano.
A sentença foi baseada em uma agressão cometida pelo delegado em 2012, quando a ex-esposa teria ido a residência de Alcídio, ao ser chamada para cuidar do filho. Considerando as circunstancias judiciais do art. 59 do Código Penal, atendendo à culpabilidade, que é alta, pois delegado; aos antecedentes; à conduta social; à personalidade do agente; aos motivos; circunstâncias desfavoráveis, pois o réu sabia do estado emocional da vítima (...) fixo, por ser necessária e suficiente, a pena-base em 06 (SEIS) MESES DE DETENÇÃO, pena que torno definitiva em razão da inexistência de outras agravantes e atenuantes genéricas, causas de aumento ou diminuição da pena, devendo o acusado iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade em REGIME ABERTO, explica a decisão.
A decisão, que acatou um pedido do Ministério Público Estadual (MPE), contém outros detalhes, como histórico de agressões, indicado pela medida protetiva da ex-esposa. Realizada a instrução, a vítima narra que na data dos fatos estavam separados; na época já tinha medida protetiva; o réu ligou dizendo que o filho estava precisando da vítima porque estava doente; levaram ao hospital; novamente o réu ligou para a vítima dizendo que o filho continuava a chorar, assim, a vítima retornou para residência do réu para atender o filho; a vítima ficou com o filho o tempo todo no colo para que ele parasse de chorar, afirma a juíza.
No dia da agressão, conforme o documento, também estaria presente a esposa de Alcídio à época, uma enfermeira, e que o delegado teria negado estar casado. O réu ligou para a atual esposa dele, mas disse que essa mulher era contratada como enfermeira do filho, mandou a vítima embora, mas como a vítima disse que não ia deixar o filho, o réu desferiu soco e um beliscão na vítima; com o soco a vítima soltou a criança e foi tocada da casa.
Histórico de agressões
No documento que descreve o dia da agressão, também há afirmações que remetem ao episódio em que a ex-esposa do delegado teria perdido a guarda do filho, indicando que a mulher sofria de possível abusivo físico e psicológico no relacionamento. Alcídio conseguiu a guarda da criança ao alegar na justiça que a ex-esposa teria problemas mentais e psicológicos.
Reintegração de posse
Alcídio de Sousa Araújo participou da reintegração de posse da fazenda Buriti no ano de 2013, em favor do ex-deputado Ricardo Bacha. Depois do episódio, Otoniel Terena, irmão de Oziel Gabriel, afirmou que o tiro que matou Oziel partiu de um grupo de policiais federais que tentava retirar os Terena da fazenda de Ricardo Bacha incidente no território tradicional.
No dia da [primeira tentativa] da reintegração [em 19 de maio; a ação que resultou na morte de Oziel Terena ocorreu depois, no dia 30 de maio], o delegado apreendeu um computador, um gravador e lentes para câmara fotográfica, retirados da mochila de um jornalista do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Ruy Sposati, que estava junto com outros profissionais de comunicação, cobrindo a ação no local.
À época, Alcídio também era Chefe da Delegacia de Controle de Segurança Privada/DREX/SR/DPF/MS, delegacia responsável por regulamentar a abertura e atuação de empresas de segurança privada em Mato Grosso do Sul. Uma das empresas regulamentadas pela PF, a Gaspem, consta em depoimento de Ricardo Bacha em um processo judicial contra a Acrissul (Associação dos criadores de Mato Grosso do Sul), como contratada pelo ex-deputado para realizar a segurança da fazenda.
Em 2014 a Justiça acatou a decisão do Ministério Público Federal (MPF) e determinou que a empresa fechasse as portas por considerar que há perigo de novas agressões e ilícitos executados pela Gaspem, mormente o elevado número de propriedades em litígio (consideradas terras tradicionais pelos indígenas) para a vigilância das quais a demandada está contratada.
O delegado já prestou depoimento à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Cimi. No depoimento, ele afirmou que o vereador indígena Terena, Cledinaldo Cotócio (PROS) de Sidrolândia, teria dito a ele e ao Superintendente da PF que o Cimi seria componente desmobilizador da saída dos indígenas da área, à época da reintegração. A versão foi contestada e negada pelo próprio vereador quando este prestou depoimento à CPI.
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